Friday 31 July 2009

A MULHER DA CALCINHA DE ALGODÃO

Ela anda pela casa com o jeito mais despreocupado do mundo. Cabelo castanho quase ondulado na manhã de uma lembrança. Pegando a torrada besuntada de geléia diet com a pontinha dos dedos, acha que está mais gorda do que queria estar, como toda mulher. É linda em sua imperfeição.
O camisão gigantesco é secular e faz questão de não esconder nenhum furinho feito pelo tempo...é provavelmente uma das coisas que mais guarda o seu cheiro matinal totalmente viciante. O beijo dado ainda nos lençóis, vem entre um sussuro ainda ininteligível de que a preguiça era maior que ela e os cabelos desgrenhados pela noite, qualquer propaganda perderia em naturalidade para seus miados.
Ela tem manias e defeitos como todo ser vivo e adora tascar um beijo mesmo antes de escovar os dentes. É uma dessas mulheres mágicas em sua simplicidade. A luz da manhã de um domingo qualquer, lendo seu jornalzinho, pergunta algo que sabe que não sei só para poder fazer graça de mim. E fica feliz quando me ensina uma palavra nova, cantarola uma música que nunca tocou no rádio, mas que só ela sabe de cor.
Tem calcinhas chiques para ocasiões especiais, cheias de rendas como troféus para quem a despe. Ela sabe onde comprar aquela cinta liga alucinante que faz qualquer homem babar, e certamente tem, pelos menos,uma guardada da forma mais despreocupada possível na gaveta que você nunca abre.
Reclama da minha barba mal feita que, às vezes, roça em sua nuca ou em suas coxas. Adora quando falo de seu umbigo ou quando peço para ela pararde me morder porque marca. Vive falando mal da celulite que imagina estar invadindo seu corpo. Élasciva o suficiente para conseguir tudo o que quer com uma chantagenzinha emocional barata. Me chama por um apelido que só ela usa e fala sarcasticamente mal de qualquer coisa que eu escreva só pra depois pular no meu colo dizendo que era brincadeira. Deixa a gola esgarçada do camisão para me mostrar o ombro e, quando salta pra pegar mais café, me diz cinicamente que é para parar de olhar sua bunda.
Ah a mulher da calcinha de algodão branco.
Como tantas outras calcinhas que contam histórias secando nas torneiras do chuveiro. As calcinhas comuns, sem ocasiões especiais, sem desculpas por não serem sempre novas e lindas. A mulher que reclama quando faço algo que ela odeia, a mulher que aperta meu pneuzinho perguntando de quem são aquelas carnes.
Existem poucas cenas mais completas do que assistir ao sono dela em sua calcinha branca de algodão.
Acho que a calcinha me fascina justamente pela sua idéia de cumplicidade. De sempre estar alí. Pendurada no banheiro, dobradinha em cima da cama esperando sumir numa interminável gaveta ou andando pela casa antes de se esconder dentro de uma calça numa terça-feira. Essa mulher é a que no elevador me puxa com o olhar mais tarado do mundo e, segundos antes da porta abrir, me pergunta como está o decote.
A mulher da calcinha de algodão anda por aí, todos os dias, desapercebida em sua simplicidade, fingindo uma timidez educada que esconde seu senso de humor debochado e sua vontade eterna em me ver bebendo vinho nas curvas de suas costas enquanto compromissos esperam. Ela é uma mulher, como tantas outras, incomparável. Mesmo quando a gravidade inevitavelmente ganha suas batalhas e o tempo alembra das aulas de ginástica que ela não tem mais 17 anos. E daí se as pernas forem mais finas do que ela sempre quis que fossem? E daí se seu pé não apareceria em outdoors de sandálias? Sei que ela sempre vai elogiar as modelos que trabalham como cabides ambulantes para os grandes nomes da moda. Sei que ela sempre vai dizer queeu preferiria ver a Gisele Bündchen de biquíni numa revista do que tê-la ao meu lado.
E essa é uma das coisas boas dela. Eu sei de um monte de coisas e ainda não me cansei disso. Ela sempre vai ter algo inteligente ou debochado para dizer, sempre vai reclamar que eu deveria dirigir com mais calma e fazer pouco das outras mulheres que foram menos que ela na minhavida. Esta mulher fica mestruada e reclama disso, sempre fala que fica inchada e se acha um barangão quando está de mau humor.
Esta mulher é fálivel e real. Além de ser apaixonada por mim deve andar por ai olhando discretamente pra outros homens (sem nunca fazer nada), pode certamente comentar de meus defeitinhos para suas amigas ou ainda sonhar em ir a uma praia sem areia, que se amontoa dentro do seu biquini. Ela vive, toma decisões erradas e ostenta outros milhões de defeitos. Todos eles apaixonantes, porque vêm de alguém real e não de uma boneca de cera sem personalidade que muito homem queria ter para mostrar para os amigos...

3 comments:

  1. Essa mulher da foto é muito magra, quase um esqueleto.

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  2. De onde este texto? Dá até um ciúminho dessa mulher! hhehehe
    Adorei ouvir tua voz hj. Saudades do teu sorriso. Tive que recorrer a fotos!
    beijos

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  3. Não é ciúme, não, é vontade de ser ela! hehe

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